Que em 1848 os revolucionários de Paris tenham defendido as eleições diretas como um grande avanço e que no Brasil tenham feito o mesmo em 1984 é compreensível, dadas as circunstâncias – os parisienses nunca tinham experimentado uma eleição como as que hoje são comuns, e os brasileiros sabiam que eleger diretamente um Presidente seria uma boa maneira de colocar fim à Ditadura.
Porém, logo em 1871, os parisienses apresentaram ao mundo uma democracia bem melhor que a capitalista, a Comuna de Paris. Um deputado era eleito a cada pequeno bairro de Paris, e os eleitores podiam depô-lo. Essa Comuna, um parlamento, escolhia e depunha os administradores da cidade. A Comuna, primeira experiência de poder do povo trabalhador, influenciou Marx, que a defendeu apaixonadamente mesmo depois de vencida pela força, e Lênin, que sempre falava aos russos de seguir “o exemplo da Comuna”. Os Soviets não eram idênticos à Comuna, mas Lênin logo percebeu que eram semelhantes, ao ponto de defender seu poder, entendendo que isso seria, como foi, a Revolução.
Os Soviets (palavra russa para ‘conselhos’) surgiram em 1905, em uma cidade localizada entre Moscou e Leningrado. Cada fábrica tinha um conselho que elegia um representante para o conselho (Soviet) municipal. O exemplo foi seguido por outras cidades, e depois começaram a ser criados Soviets de camponeses, soldados, estudantes e também regionais e de toda a Rússia. Em 1907, foram duramente reprimidos pelo governo do Tzar Nicolau II, um sanguinário. Em 1917, quando o Tzar caiu, os Soviets voltaram a existir. Um Abril, Lênin passou a defender que se devia lutar para lhes entregar o poder. Em Outubro (7 de Novembro no calendário ocidental) uma insurreição os levou ao poder. Em 1929, depois de duros ataques de 11 potências aliadas aos contra-revolucionários na guerra de 1918 a 1921, e da Nova Política Econômica que não era socialista, mas segundo Lênin um capitalismo de Estado, permitiram o início da construção de uma economia socialista. Em 1936, devido à crise em que os camponeses (80% dos russos) entraram após a socialização dos campos, uma Assembléia Constituinte aboliu os Soviets e deu esse nome a parlamentos eleitos da forma capitalista. Stálin não foi o responsável por isso, mas a reação dos comunistas à dissolução dos Soviets tanto permitiu que se colocasse em prática a Constituição de 1936. Contudo, essa reação não foi suficiente, pois os Soviets já estavam mortos, e sem eles a Revolução não renovou suas forças, vindo a começar a retornar ao capitalismo na década de 1950 e terminar a jornada em 1990.
Alguns brasileiros, contudo, ainda não entenderam, mas não são os desinformados e sim as lideranças, a começar por muitas de esquerda, o que parisienses e russos entenderam em 1871 e 1917. Os desinformados guiam-se pela prática, e se lembram que desde 1985 elegem livremente prefeitos em 5 mil municípios, governadores em mais de 20 estados e presidentes. Sendo no mínimo 6 eleições em cada, temos mais de 30 mil eleições, e o povo continua não mandando em nada!
Conclusão dos desinformados: o voto vale menos que um saco de cimento, ou que um par de sapatos. A democracia é robalheira, carreirismo, intrigas, sujeira, “a política”. As lideranças deviam entender, pois devem ter estudado O Estado e a Revolução de Lênin, e A Comuna de Paris, de Marx, que existem diferentes democracias, e que vivemos em uma capitalista. Deviam explicar e exemplificar isso para o povo, de forma a não lhes deixar nas mãos da direita autoritária, que prega cada dia mais abertamente a ditadura. Mas hoje somente algumas forças socialistas e o TSE defendem a democracia capitalista!!?? A direita está de mãos livres para defender seus regimes autoritários, pois sabe que não precisa se preocupar em defender esta forma de controle do capital, uma vez que a esquerda já o faz!
É chegado o momento de passar à ofensiva. Temos que defender, em todos os espaços, uma democracia mais avançada, que não tem que ser cópia nem da Comuna nem dos Soviets, mas normalmente se parece com eles. Uma democracia em que os mandatos sejam revogáveis. Uma democracia em que o poder financeiro seja abolido. Uma democracia que dê mais espaço para o debate de idéias que para o personalismo. Uma democracia altamente enraizada nas bases. A direita que fique com o trabalho de defender a democracia capitalista, até para que fique sem tempo e sem cara de defender suas bizarrices autoritárias.
Muito bom texto. O blog depois de tanto tempo sendo visto no mundo todo...
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